Pesquisa do Idec demonstra que preço teto dos medicamentos não impede reajustes abusivos

Pesquisa do Idec demonstra que preço teto dos medicamentos não impede reajustes abusivos

28 de março de 2023 Off Por Ray Santos
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Estudo revela que qualquer que seja o próximo índice de aumento, preços poderão ser aumentados em várias vezes sem que isso seja considerado ilegal

Em poucos dias a Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (Cmed), órgão responsável por limitar e fiscalizar preços de medicamentos no Brasil, vai divulgar o valor do reajuste do preço desses produtos essenciais nas farmácias e nas compras públicas. Chamado de preço teto dos medicamentos, esse valor é reajustado todo ano, mas segundo comprovou uma pesquisa divulgada nesta segunda-feira (27) pelo Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor), seja qual for a porcentagem de aumento divulgada, isso provavelmente não vai limitar que aumentos absurdos sejam aplicados em remédios nos próximos meses.

“Não é a primeira vez que realizamos essa pesquisa e nos deparamos com esse grave problema. Os números encontrados reforçam cada vez mais o grande problema de regulação em medicamentos que temos no Brasil: um teto de preços que não cumpre a sua função de impedir aumentos abusivos, como aconteceu durante a pandemia de Covid 19 com muitos medicamentos que tinham grande procura”, afirma Ana Carolina Navarrete, coordenadora do programa de Saúde do Idec.

De acordo com o estudo, a diferença entre os preços dos medicamentos pesquisados em relação ao preço teto chega a até 936,39% em valores praticados em compras públicas e a 384,54% nas compras realizadas pelos consumidores em farmácias. 

“Um preço-teto tão distante assim não cumpre a sua função, que é limitar aumentos abusivos. Vejamos o caso do Dolutegravir Sódico, usado no tratamento da infecção pelo HIV, que em compras públicas do governo custou R$ 123 a caixa no ano passado, mas possui preço teto de R$ 1.274,76. Isso significa que se do dia para a noite a farmacêutica aumentar em 10 vezes o preço da caixa, ela não vai estar infringindo a lei. Um absurdo como esse só ocorre em um mercado que na prática não tem uma regulação de preços no setor”, completa Navarrete.

Segundo a pesquisa, os preços teto estabelecidos pela Cmed podem superar os 300% em relação aos valores praticados nas compras públicas. E, em 10 dos 11 medicamentos pesquisados, a diferença ficou acima dos 100%, como é apresentado na tabela abaixo:

Já nas compras em farmácias, feita a partir de uma média de preços pesquisados nas três maiores redes nacionais, o consumidor também encontra uma grande distorção entre o preço teto e o comercializado. Nos medicamentos de referência, os valores ficaram entre 29,51% (caso do Glifage xr, um antidiabético) e 86,08% (Clavulin, um antibiótico). Nos medicamentos genéricos, a variação ficou entre 384,54% (Omeprazol, um antiulceroso) e 91,90% (Atenalol, um anti-hipertensivo). Já para os similares, essa variação ficou entre 28,89% (Venzer) e 32,20% (Aradois).  Veja todos os dados no sumário da pesquisa.

Outro resultado comprovado pela pesquisa revela que a diferença na forma de comprar o medicamento também interfere no seu preço. Mesmo em farmácias da mesma rede, comprar pelo site, presencialmente, ou fazer o cadastro fornecendo o número do CPF para ganhar um desconto interfere no valor pago. Em um dos medicamentos, a Liraglutida, um remédio usado em casos de diabetes e para combater a obesidade, a distância entre o preço cobrado ao consumidor e o teto da Cmed aumentou de 7,66% para 54,84%, com o desconto concedido.

“Uma variação tão grande como essa não tem uma justificativa clara para o consumidor. Esse fenômeno revela um aspecto assustador do mercado farmacêutico: nunca sabemos, de fato, quanto vale aquele produto. Em uma relação em que os consumidores estão em uma situação especialmente vulnerável – porque comprar remédio não é opção, é necessidade -, é inadmissível uma margem tão grande para abusos por parte da indústria”, afirma Matheus Falcão, um dos pesquisadores responsáveis pelo estudo.

Desde março de 2020, o Projeto de Lei 5591/20, de autoria do senador Fabiano Contarato (Rede-ES), que altera as regras para a definição dos preços de novos medicamentos no mercado brasileiro e impõe novos requisitos de transparência para as empresas do setor está parado no Senado sem nenhuma tramitação. “Já fizemos uma campanha pela aprovação deste projeto de lei que contou com a assinatura e apoio de mais de 52 mil pessoas, mas o PL tem três anos e sequer foi designado para uma comissão. Agora está nas mãos do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, colocá-lo para andar e indicar um relator, encaminhar para comissões e para as discussões necessárias. O que não dá é ficar vendo todo ano uma estrutura do governo federal trabalhando para propor um teto de preço para os medicamentos que não tem efeito nenhum para a população, que segue desprotegida de abusos. E a solução para esse problema está posta. Falta vontade política para que ela ande”, completa Navarrete.

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Idec – Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor


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