Projeto de Pacheco para regular impeachment detalha regras processuais

Projeto de Pacheco para regular impeachment detalha regras processuais

25 de março de 2023 Off Por Ray Santos
Compartilhar

Da Agência Senado | 24/03/2023, 13h58

Projeto de Pacheco, de nova lei do impeachment, tem regras processuais detalhadas e estende número de crimes de responsabilidade e de autoridades que podem ser punidas com o afastamento definitivo
Edilson Rodrigues/Agência Senado

Fonte: Agência Senado

O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, apresentou na quinta-feira (23) projeto de lei  que sugere um novo rito para os processos de impeachment contra autoridades. O PL 1.388/2023 dá prazo para que o presidente da Câmara dos Deputados decida se aceita a denúncia por crime de responsabilidade contra o presidente da República. Outra novidade é a possibilidade de denúncia por partidos políticos, sindicatos e Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). A matéria aguarda distribuição para as comissões permanentes da Casa.

O texto é resultado de um anteprojeto proposto por uma comissão de juristas instalada no ano passado por Rodrigo Pacheco. Presidido pelo ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), o grupo recomendou a revogação da Lei 1.079, de 1950, que define os crimes de responsabilidade e regula o processo de julgamento.

“A atual Lei de Crimes de Responsabilidade foi pensada para um outro contexto social, político e constitucional que não o nosso. Sua vigência até os dias atuais deu-se às custas de recepção parcial pela Constituição de 1988, que a tornaram uma lei lacunosa, incompleta e inadequada. As disposições mostraram-se, no mínimo, anacrônicas e desatualizadas”, avalia Pacheco na justificativa do projeto.

O PL 1.388/2023 amplia o rol de autoridades sujeitas a processos de impeachment. Além do presidente e do vice-presidente da República, podem ser denunciados por crime de responsabilidade:

  • ministros e comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica;
  • ministros do STF;
  • membros dos conselhos nacionais de Justiça e do Ministério Público;
  • procurador-Geral da República;
  • advogado-geral da União;
  • ministros de tribunais superiores;
  • ministros do Tribunal de Contas da União (TCU);
  • governadores e vice-governadores;
  • secretários de estados e do Distrito Federal;
  • juízes e desembargadores;
  • juízes e membros de tribunais militares e tribunais regionais Federais, Eleitorais e do Trabalho;
  • membros dos tribunais de contas de estados, Distrito Federal e municípios; e
  • membros do Ministério Público da União, dos estados e do Distrito Federal.

Crimes do presidente

O projeto tipifica uma série de novos crimes de responsabilidade. No caso do presidente da República, eles são divididos em cinco grandes áreas. Uma das novidades é a seção exclusiva para crimes contra as instituições democráticas, a segurança interna do país e o livre exercício dos poderes constitucionais.

O projeto classifica como crime decretar estado de defesa, estado de sítio ou intervenção federal sem os requisitos previstos na Constituição. O mesmo vale para o emprego das Forças Armadas em operações de garantia da lei e da ordem sem previsão legal.

O texto pune o presidente da República que constituir, organizar, integrar, manter, financiar ou fazer apologia de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático. Outro crime previsto é fomentar a insubordinação das Forças Armadas ou dos órgãos de segurança pública.

Instalada durante a pandemia de coronavírus, a comissão de juristas tipificou como crime deixar de adotar as medidas para proteger a vida e a saúde da população em situações de calamidade pública. Na seção de crimes contra o exercício dos direitos e garantias fundamentais, o projeto lista, entre outros, os seguintes delitos:

  • estimular a prática de tortura ou de tratamento desumano ou degradante;
  • praticar, induzir ou incitar a discriminação ou o preconceito de origem, raça, cor, idade, gênero, etnia, religião ou orientação sexual; e
  • incitar civis ou militares à prática de violência de qualquer natureza.

O PL 1.388/2023 traz ainda um rol de crimes contra a existência da União e a soberania nacional, contra a probidade na administração e contra a lei orçamentária. Ao todo, o projeto classifica como crime de responsabilidade pelo menos 38 condutas do presidente e do vice-presidente da República.

Militares e magistrados

O texto também tipifica crimes cometidos por magistrados e comandantes do Exército, da Marinha e da Aeronáutica. Entre os militares, passa a ser crime expressar-se por qualquer meio de comunicação a respeito de assuntos político-partidários, incitar ou participar de greve ou motim e realizar ou permitir atividades de inteligência com desvio de finalidade.

No caso dos magistrados, a regra vale para ministros do STF, dos tribunais superiores e do TCU, além de juízes e desembargadores e membros dos tribunais de contas de estados, Distrito Federal e municípios. Entre outras condutas, é considerado crime:

  • participar de julgamento sabendo estar impedido;
  • exercer atividade ou manifestar opinião político-partidária;
  • manifestar opinião sobre processos ou procedimentos pendentes de julgamento;
  • receber auxílios ou contribuições de pessoas físicas ou de entidades públicas ou privadas, exceto as destinadas a atividades de cunho acadêmico;
  • revelar fato ou documento sigiloso de que tenha ciência em razão do cargo; e
  • proferir voto, decisão ou despacho estando fora da jurisdição.

Processo de julgamento

Ao definir regras claras para o processamento dos casos de impeachment, o PL 1.388/2023 também cobre uma lacuna da legislação em vigor. Nos dois episódios recentes de impedimento de presidentes da República, por exemplo, o STF precisou ser acionado para fixar um rito processual. Dos 81 artigos do projeto de lei, 60 detalham o caminho que deve ser percorrido do início ao fim da ação: denúncia, abertura de processo, instrução, defesa e julgamento.

O texto prevê a produção de provas documentais, testemunhais e periciais, além da manifestação da acusação e da defesa. Na fase de instrução, a autoridade acusada fica afastada da função por até até 180 dias. Durante o julgamento, o órgão competente deve avaliar as provas e a gravidade dos atos praticados antes de decidir definitivamente sobre a acusação.

Nas denúncias apresentadas contra presidente e vice-presidente da República, ministros e comandantes das Forças Armadas em crimes conexos, a denúncia e a autorização para abertura do processo tramitam na Câmara dos Deputados. As fases de instrução, defesa e julgamento cabem ao Senado. Os senadores também processam e julgam crimes de responsabilidade cometidos por ministros do STF, procurador-geral da República, advogado-geral da União e membros dos conselhos nacionais de Justiça e do Ministério Público.

As Assembleias Legislativas e a Câmara Legislativa do Distrito Federal julgam governadores, vice-governadores e secretários. O STF fica com os casos atribuídos a ministros de tribunais superiores e do TCU, além de chefes de missão diplomática de caráter permanente e ministros de estado e comandantes das Forças Armadas em crimes sem conexão com o presidente da República.

Denúncia

A atual Lei de Crimes de Responsabilidade permite que qualquer cidadão denuncie o presidente da República ou um ministro de estado por crime de responsabilidade na Câmara dos Deputados. Basta que o cidadão assine a denúncia com firma reconhecida e apresente documentos que comprovem a acusação.

O PL 1.388/2023 mantém a possibilidade de o cidadão pode oferecer denúncia contra as autoridades. Mas o pedido deve preencher os requisitos da iniciativa legislativa popular. No âmbito federal, a Constituição exige a assinatura de um por cento dos eleitores, distribuídos por pelo menos cinco estados da Federação. Em cada um deles, é preciso no mínimo três décimos dos eleitores.

O projeto também autoriza que algumas entidades ofereçam a denúncia. É o caso de partido político com representação no Poder Legislativo, OAB, entidade de classe ou organização sindical em funcionamento há pelo menos um ano.

A denúncia por crime de responsabilidade é apreciada preliminarmente pelo presidente da casa legislativa competente. A lei em vigor não estabelece um prazo para essa decisão, mas o PL 1.388/2023 dá 30 dias úteis para o parlamentar decidir se acolhe ou não a denúncia.

Se não ele não se manifestar nesse prazo, a acusação é arquivada. Se acatar a denúncia, o presidente da casa legislativa ainda precisa submeter a decisão à deliberação da Mesa.

O texto prevê a criação de uma comissão especial, que terá 20 dias uteis para decidir sobre o encaminhamento da denúncia ao Plenário. Nesse prazo, o colegiado deve realizar diligências para esclarecer os fatos narrados na denúncia. A comissão pode convocar testemunhas. Nesta fase, o acusado tem amplo direito de defesa e pode inclusive prestar depoimento pessoal.

Se, por maioria simples, a comissão especial decidir pelo encaminhamento da denúncia, o caso é levado ao Plenário em votação aberta e nominal. Se o denunciado for o presidente ou o vice-presidente da República, ministro de estado ou comandante das Forças Armadas, a denúncia precisa ser aprovada por dois terços dos membros da Câmara dos Deputados. Nos demais casos, a abertura pode ser aprovada por maioria simples da casa legislativa. Autorizada a abertura do processo, o julgamento continua mesmo em caso de renúncia.

Impeachment de presidente

Nos processos contra presidente e vice-presidente da República, ministros e comandantes das Forças Armadas, a autorização da Câmara é encaminhada ao Senado. Uma comissão especial formada por senadores indicados pelos líderes partidários deve analisar documentos e ouvir testemunhas.

Antes de instaurar o processo por crime de responsabilidade, os senadores precisam decidir sobre a admissibilidade da denúncia. Se a comissão especial concluir pela instauração do processo, o parecer do colegiado é levado ao Plenário. A aprovação depende da maioria simples de votos dos senadores.

Caso a denúncia seja admitida, o presidente do STF assume o comando do Senado para instaurar e conduzir o processo de impeachment. O acusado é afastado das funções, mas, se o julgamento não for concluído em 180 dias, ele pode voltar e permanecer no cargo até o final do processo.

A sessão de julgamento depende da presença da maioria dos membros da Casa. Após a leitura do parecer da comissão especial, começam os debates orais entre acusação e defesa. Após essa fase, o acusado é arguido pelos senadores, mas pode permanecer em silêncio.

Depois da arguição do acusado, os parlamentares começam a discutir a acusação. Só após essa fase de debates é que o presidente da sessão pode colher os votos dos julgadores. Os senadores devem responder “sim” ou “não” à seguinte pergunta: “Cometeu a autoridade acusada o crime que lhe é imputado e deve ser condenada à perda do cargo?”

Pena

Se for considerada culpada por dois terços dos senadores, a autoridade perde o cargo público. Neste caso, o presidente da sessão realiza uma segunda votação para decidir sobre a perda dos direitos políticos por até oito anos.

O prazo de inabilitação deve levar em conta antecedentes, personalidade e conduta social do acusado, além de motivos, circunstâncias e consequências do crime de responsabilidade. O projeto proíbe a imposição de outras penas — como multa, perda de bens, prisão, exílio ou deportação.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)

Fonte: Agência Senado


Compartilhar