O método mais indicado de resolver conflitos familiares
26 de julho de 2024Um dos núcleos de convivência de maior relevância na vida social, desde os primórdios da humanidade, é constituído pela família. Por meio dela, nós, seres humanos, desenvolvemos nossas primeiras interações com o outro, aprendendo noções de alteridade, empatia, solidariedade e confiança. Também em seu seio surgem inevitáveis conflitos, com algumas particularidades, com destaque para a sua repercussão em outros campos da vida da pessoa, fenômeno explicado pela psicologia, e pela necessidade de preservação das relações entre os envolvidos, sempre continuadas e envoltas em questões de amor e afeto.
Geralmente tais conflitos são complexos e dolorosos, o que se reflete, no Brasil, em um grande número de litígios judicializados. O Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), em particular, dispõe de duas câmaras especializadas em direito de família, entre outros diversos juízos para discussão incidental do tema, com o objetivo precípuo de julgar os conflitos em prazo razoável. A despeito disso, apenas no período de um ano, entre 2022 e 2023, foram julgadas quase 20 mil ações dessa natureza, sem um correspondente decréscimo na taxa de congestionamento.
O tempo acaba sendo um elemento essencial nessas disputas, pois, à medida que os meses e anos passam, a falta de solução pode incendiar ainda mais as relações já conturbadas, dificultando a chance de os laços familiares serem reatados. Para além disso, as decisões judiciais, por definição emitidas por um terceiro estranho ao litígio, tendem a desagradar a pelo menos um dos litigantes, exacerbando o conflito e dificultando a convivência posterior entre eles.
Nesse cenário, avulta a importância da mediação como método mais indicado para lidar com os problemas de ordem familiar, exatamente por oferecer uma resposta mais célere e, principalmente, consensual, afastando-se do maniqueísmo judiciário que cria as figuras do vencedor e do derrotado. Por meio dela, possibilita-se um diálogo extrajudicial entre os envolvidos; o problema que os opõe mantém seu protagonismo, contemplando-os e eliminando as barreiras que os distanciam. Trata-se do método que melhor salvaguarda o relacionamento entre os envolvidos, e que por isso se coaduna com a fraternidade, caracterizado justamente por resgatar a percepção da existência digna do outro, da necessidade de diálogo e respeito, da mútua compreensão da diversidade e ponderação das divergências.
Há mais vantagens presentes nesse tipo de disputa. Além de evitar as custas processuais e advocatícias que também ferventam o caldo do ódio mútuo, a confidencialidade e a flexibilidade são ingredientes irrevogáveis no processo de solução. A mediação é feita por um voluntário totalmente imparcial e qualificado, sem nenhum interesse direto ou indireto no conflito nem no seu resultado: seu papel é de ouvir os pontos de vista e de ajudar a identificar os principais pontos de discordância, facilitar a comunicação a fim de se tentar uma negociação e de formalizar um acordo, quando houver.
É importante esclarecer que esse tipo de diálogo só é aberto mediante o aceite das partes, não existindo obrigatoriedade de participação. Mas é esse tipo de contato que pode impedir a morosidade e, ao mesmo tempo, transformar uma solução judicial imprevisível em um ganha-ganha por meio extrajudicial, com acordo que, por si só, pode ser exigido na justiça, independentemente de qualquer outra providência. O foco da mediação, porém, não está exatamente nesse resultado final, mas sim na transformação dos envolvidos, no fortalecimento do diálogo, no empoderamento dos seus protagonistas e na consequente construção, compartilhada, a partir da empatia e sensibilidade, da solução que mais se adequa ao caso mediado.
As autoras são Jéssica Gonçalves e Luciana Estevão advogadas e sócias da Unniversa Soluções de Conflitos