O voto do Ministro André Mendonça na ADI 5553: uma terceira via que está aquém da segurança alimentar
26 de outubro de 2023Por Dra. Lídia Cristina J dos Santos, advogada e membro do Conselho Científico Agro Sustentável
A ADI 5553, que questiona a constitucionalidade das renúncias fiscais para os defensivos agrícolas, teve um novo capítulo na semana passada, com o voto do Ministro André Mendonça.
O Ministro abriu uma terceira via de julgamento, aplicando a técnica da declaração de inconstitucionalidade, em parte, mas sem pronúncia de nulidade, afirmando que há um processo de inconstitucionalização das desonerações fiscais federais e estaduais dos defensivos agrícolas, fixando um prazo de 90 dias para que o Poder Executivo da União, quanto ao IPI, e dos Estados quanto ao ICMS, promovam uma adequada e contemporânea avaliação da política fiscal, de modo a apresentarem para o STF os limites temporais, o escopo e os custos dela resultantes.
O voto do Ministro André Mendonça se distancia dos votos anteriores do Ministro Relator Edson Fachin, que julgou inconstitucionais essas isenções, e do Ministro Gilmar Mendes, que julgou totalmente constitucionais.
No entanto, a terceira via proposta pelo Ministro André Mendonça não é satisfatória, pois ainda revela uma visão equivocada sobre a segurança dos defensivos agrícolas e sua regulação.
O Ministro André Mendonça entende que os “agrotóxicos”, terminologia empregada em voto, foram considerados nocivos pelo próprio Poder Constituinte. Por outro lado, ressalta que esses produtos são, neste momento, absolutamente necessários para a nossa agricultura.
Para justificar a nocividade, Sua Excelência utilizou como exemplo o produto Endossulfan, inseticida que teve registro no Brasil, mas posteriormente foi proibido pela ANVISA em 2010.
Com o devido respeito, a utilização dos defensivos agrícolas para o controle de pragas não é só necessária, mas também é lícita e extremamente regulamentada.
O fato de produtos serem reavaliados e terem o seu uso descontinuado, como ocorreu com o produto Endossulfan, registrado da década de 70 e proibido em 2010, não significa que o poder público anuiu com o uso de um produto ilícito por mais de 40 anos.
Significa que as autoridades competentes ao fazerem uma reanálise dos riscos envolvidos e das medidas necessárias para o seu gerenciamento entenderam que o seu uso na agricultura brasileira não era mais necessários, quer por existirem outros produtos que poderiam ser utilizados em sua substituição, sem que isso implique em quebra da produção e das exportações brasileiras, quer porque à luz da evolução da ciência verificou-se um risco não mais aceitável.
A decisão de reavaliação de um defensivo agrícola é uma decisão regulatória que analisa novos estudos sobre segurança ambiental e toxicológica, as necessidades e novas tecnologias disponíveis para agricultura.
Dessa forma, agiu bem o Ministro Gilmar Mendes ao tratar da necessidade e segurança dos produtos registrados.
Outro ponto a ser observado é que o Convênio 100 tem sido renovado constantemente, de modo que o CONFAZ já faz uma reanálise das condições e necessidades de isenções para esses produtos. A isenção existe para permitir um barateamento do preço dos alimentos.
Em seu voto, o ministro André Mendonça apontou que existe uma grande polaridade ao tratar desse tema, o que é verdade. Há muita ideologia e pouca ciência ao se falar em defensivos agrícolas.
Mas a polaridade ideológica existente não pode ser usada para se permitir que o alimento fique mais caro na mesa do brasileiro e não pode influenciar as decisões judiciais sobre o tema.
A ADI 5553 é uma oportunidade para o STF reconhecer a importância desses insumos para a agricultura brasileira (pois sem eles a nossa produção seria 50% menor e com a necessidade de utilização de novas áreas) e para a segurança alimentar da população, já que o conceito de segurança alimentar inclui, certamente, a disponibilidade e o menor custo de produção de alimentos.
A política fiscal que reduz a carga tributária sobre esses produtos é constitucional e legítima, pois visa incentivar o desenvolvimento rural e garantir a competitividade do agronegócio nacional.
A terceira via do Ministro André Mendonça não contribui para esse objetivo, pois cria uma insegurança jurídica e uma interferência indevida do Poder Judiciário na política agrícola. Espera-se que os demais ministros sigam o voto do Ministro Gilmar Mendes e julguem improcedente a ADI 5553.
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