“Pessoas são o grande diferencial competitivo”
17 de dezembro de 2022Então, por que as empresas estão juniorizando as áreas de RH?
*Por Martinelli – Foto: Youtube/Google
Executivos defendem em congressos e entrevistas como o potencial humano tornou-se a principal resposta frente aos desafios atuais de mercado. E não precisa ser muito brilhante para se entender isso.
Ora, se de fato esta é uma compreensão quase unânime, deduz-se que o departamento que orquestra o ciclo de vida dos colaboradores ganhou mais atenção e investimento.
Estou me referindo à área de RH, que até tem recebido outros nomes para destacar seu novo “suposto” status: Área de Gente, People, DHO, Employer Experience… Mas, será que esta valorização dos colaboradores e, consequentemente, dos profissionais especialistas em cuidar é um fato ou é só um discurso politicamente correto?
Levantamento realizado pela plataforma Vagas.com (agosto/22) constatou que 24% dos profissionais de RH (1 em cada 4, em média) foram demitidos por serem considerados velhos para o cargo. Sei que este “fenômeno” não se restringe apenas ao RH.
O etarismo (preconceito com pessoas de mais idade) é um problema generalizado com implicações éticas, culturais e funcionais. Atinge indivíduos, impacta na competitividade dos negócios e gera problemas sociais. E o tema, infelizmente, não está nem na pauta da maioria das empresas, mesmo muitas daquelas que têm ações de estímulo à diversidade!
Entretanto, nesse momento, vou falar sobre o resultado dessa pesquisa não pelo aspecto do etarismo, mas sim pelo impacto do desligamento de pessoas mais experientes e, consequente, a contratação de profissionais mais jovens na área de RH.
Além do etarismo, outra razão que leva ao desligamento de profissionais com maior senioridade e a contratação de mais novos é a redução dos salários pagos. Porém, como as empresas pensam que conseguirão obter diferencial competitivo por meio dos colaboradores “juniorizando” a área de RH? Me parece uma incoerência entre o que se fala e o que se pratica. Ou pior: pode ser que o coro “pessoas são o grande diferencial” não seja uma crença sincera, apenas um discurso.
Adiciono a esta análise as situações agudas que estamos vivendo: trabalho híbrido, turnover, burnout, quiet quitting, necessidade de culturas mais ágeis e inovadoras, lifelong learning… Não são nesses cenários complexos que deveríamos contar com a diversidade para encontrarmos soluções geradas pela construção coletiva?
Questionar o desligamento de pessoas mais experientes não significa desqualificar as mais novas. Estas têm qualidades e características ímpares que podem complementar perfeitamente as das mais velhas, assim como uma pilha precisa do polo negativo e positivo para operar em plena potência.
Não quero fazer generalizações e sei que nem sempre o que vou comentar acontece, mas para gerar reflexão, cito alguns pontos que observo em empresas que praticamente só têm “sangue novo” no RH:
– Gestores do RH sobrecarregados porque suas equipes não têm “musculatura” técnica para fazerem as coisas acontecerem e para resolverem problemas diários com autonomia.
– Consequentemente, clientes do RH insatisfeitos e percebendo pouco valor agregado por esta área.
– Projetos, políticas e procedimentos definidos de forma superficial, sem consistência técnica.
Às vezes, estas ações “rasas” são “embaladas” muito bem, de forma a encantar os clientes internos: uma dose de tecnologia, uma nomenclatura fashion (como algumas que já usei nesse texto rs), uma “manipulaçãozinha” emocional e todos acham o máximo!
Mas nem sempre estas ações resolvem ou minimizam os problemas do negócio, dão sustentabilidade, provocam mudanças perceptíveis e significativas. Até quando as pessoas não perceberão que estes investimentos não trouxeram um retorno perene?
Insisto: são apenas algumas reflexões. Ter uma equipe que balanceie profissionais juniores e seniores não garante uma atuação consistente, mas a probabilidade de isso acontecer é maior.
Se a companhia tem realmente a crença de que pessoas são prioridade, a área de RH precisa ter o peso estratégico coerente. Obviamente, só ter profissionais tecnicamente maduros não é suficiente, mas não tem como fugir disso.
Já passou da hora das empresas não apenas avaliarem o custo de um investimento. Tão importante quanto, é avaliar o custo de não se fazer aquele investimento.
Este último é mais difícil de ser mensurado, mas me sinto seguro de afirmar que ele é, recorrentemente, bem mais alto para a empresa.
* Martinelli é diretor executivo da Duomo Aprendizagem Corporativa e consultor com mais de 30 anos de experiência no desenvolvimento de líderes em renomadas empresas.
Gestor de pessoas desde os 23 anos, é reconhecido por ser “cirúrgico” em seus diagnósticos e pela sua fala assertiva e estratégica.
Com diversas especializações na área da Psicologia Social, é coautor do livro Team & Leader Coaching, possui Certificado no Global Leadership for the 21st Century Program, pela Universidade de Saybrook (Seattle).