Saiba por que empresas familiares têm mais dificuldades em período de crise como a alta inflação
1 de agosto de 2022Um dos fatores de resistência a ações para conter a crise é quando os sócios não querem mudar o padrão de vida
Na última semana, 25, foi publicado, segundo projeção do Boletim Focus, do Banco Central, que a expectativa do mercado financeiro é de uma queda do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro em 2023 e 2024, além de estabilidade no câmbio do dólar.
Foram ouvidos economistas de 100 instituições financeiras no Brasil para analisar os índices da economia do país até 2025, taxas como a Selic tendem diminuir em relação aos números atuais, mas ainda devem permanecer em patamares altos nos próximos três anos.
Estamos vivenciando um período de incertezas, que tem afetado empresas ao redor do país, muitos gestores se veem diante da necessidade de rever as suas estratégias de mercado, principalmente aquelas relacionadas à logística. Diante de estoque parado ou escassez de produtos é preciso tomar decisões rapidamente e essa é uma das demandas mais desafiadoras.
O mercado já tem experimentado há alguns anos o fato de que planejamentos de longo prazo não funcionam mais e essa realidade foi bruscamente confirmada por meio da pandemia global.
Como gestor de empresas e consultor à frente da MORCONE Consultoria Empresarial, Carlos Moreira compartilha algumas reflexões sobre as particularidades que envolvem empresas familiares na crise. Como se posicionar em um cenário de crise, colocando ações estratégicas acima das relações familiares?
Empresas familiares na crise – lidar com adversidades nesse segmento de negócio pode ser ainda mais complexo
Recentemente foi realizado o webinar “Desafios e o futuro dos profissionais de alta gestão”, promovido pela FGV (Fundação Getúlio Vargas). Estavam presentes no evento, o consultor nas áreas de Estratégia, ESG, Gestão Empresarial, Marketing e Vendas, Elimar Melo; o professor da FGV/EBAPE, Joaquim Rubens e o coordenador da Formação para Conselheiros da FGV, Carlos Alberto Ercolin.
Dentre vários pontos importantes discutidos, me chamou atenção pontuações realizadas pelo professor, Joaquim Rubens, que falava principalmente sobre lideranças nas empresas familiares e como esse segmento de negócio encontra ainda mais desafios em um período complexo de alta inflação e de escassez.
Rubens falava sobre o otimismo do mercado derrubado pelos fatos da realidade e sobre como os executivos e governança têm um papel decisivo na deliberação sobre os negócios, porém em empresas familiares, ele afirmou: “Empresas familiares quando entram em crise querem continuar com o padrão de vida e, isso também envolve familiares que não estão diretamente envolvidos com a empresa e que não sabem de onde vêm as fontes de recursos”.
E aqui destaco um ponto muito importante: o de como é fundamental às organizações, principalmente às familiares com o fator dos laços consanguíneos envolvidos, adquirirem maturidade em sua gestão.
Temos vivenciado uma fase de muitas complexidades e o corte de custos e reestruturação de empresas se torna muito mais difícil em empresas familiares, quando o padrão de vida dos sócios está envolvido às mudanças.
É muito comum ao apresentar soluções de redução de custos que envolverão diminuição de recursos aos sócios na empresa familiar, que exista resistência, porque muitas empresas têm a visão do negócio como “a sua casa” e não como uma organização independente e de valor social. Falta noção de realidade em muitos gestores e essa ausência de maturidade empresarial tem levado muitas empresas a dificuldades que poderiam ter sido evitadas.
Além disso, há outros fatores a serem considerados em casos de empresas familiares na crise como em como a transparência é vivenciada em todos os pilares do negócio, inclusive, no que está ligado a quanto os gestores têm ganhado e baseado em quais metas, como apontou Rubens:
“Lembro de uma empresa que fez políticas sociais muito interessantes e muito reconhecidas, mas, por outro lado, essa mesma empresa era a que tinha a maior distância entre a remuneração do CEO e a média dos empregados. O CEO ganhava em média 600 vezes mais o valor que ganhava os empregados, e isso não parece uma prática social muito adequada.”
Após isso, o professor mencionava a importância do papel dos conselhos de administração em compreender os cenários como representantes dos donos das organizações e que isso em um momento de prosperidade é algo mais fácil, mas em crise, é complexo e demanda muito mais como dizer “não” e muitas empresas não estão preparadas para isso, ou seja, muitas não têm maturidade o suficiente para lidar com as mudanças na realidade.
Essa distância entre o discurso e as ações é algo muito comum como, por exemplo, quando se fala em ESG, o conceito de sustentabilidade que se fortaleceu ainda mais durante a crise de Covid-19. Existem empresas fazendo estimativas de mudanças em seus processos que favoreçam o meio ambiente, baseadas em prazos para mais de dez anos, mas os stakeholders, que incluem os investidores querem fatos e não mais a greenwashing (o dizer que faz quando de fato nada acontece).
Existem dois papéis muito importantes que são desempenhados pelo Conselheiro:
- Articulação – que envolve a mediação visando uma decisão por consenso;
- Posição objetiva e racional – quando a situação demandar.
Em um cenário de prosperidade, como mencionado por Rubens, transitar entre os dois papéis é muito mais tranquilo, mas diante de uma crise, esse posicionamento pode ser ainda mais desafiador.
Governança precisa ser como a base da organização, ainda mais em situações de crise
Empresas familiares na crise devem contar ainda mais com a governança como aquela área que expõe os fatos, delibera ações e que faz o papel mais “difícil” de regular as iniciativas, para que estejam de acordo com a realidade do mercado.
Sem governança sólida, as empresas podem se perder em suas estratégias e sofrer as consequências de não se voltar aos fatos e à racionalidade diante de decisões mais complexas.
A mentoria e a consultoria empresarial podem ser ferramentas muito importantes para que as lideranças, principalmente de empresas familiares, possam se reestruturar diante do cenário atual do mercado.
O quanto a sua empresa está pronta para lidar com a realidade?
Por Daiana Barasa